sábado, 28 de julho de 2012
Grupo de juristas propõe alterações para modernizar Código Penal
É principalmente a partir do que está escrito no Código Penal que a sociedade decide se uma pessoa cometeu ou não crime no Brasil.
As leis brasileiras que definem o que é crime, e as sugestões de mudança nessas leis, são o tema de uma série de reportagens do Jornal Nacional, nesta semana. Um grupo de juristas propôs alterações pra modernizar o Código Penal.
Duas histórias. Dois condenados.
“Eu fui condenado a quatro anos de prisão”, disse um presidiário.
“Nunca fui mandado à prisão”, revelou um homem.
Quem você acha que pode ter cometido o crime mais grave?
“Segundo a justiça. Eu cometi homicídio qualificado”, afirmou o homem que nunca foi mandado à prisão.
“Eu roubei um celular porque não tinha nada dentro de casa, ia vender pra comprar alguma comida”, ressaltou o presidiário.
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É principalmente a partir do que está escrito no Código Penal que a sociedade decide se uma pessoa cometeu ou não crime no Brasil. Com base nestas leis, algumas escritas há 70 anos, é que os juízes, ainda hoje, no século 21, tomam suas decisões.
Um código fora do seu tempo e até com distorções, como as dos exemplos que nos vimos agora, essas mesmas leis também definem o castigo para as pessoas que cometem crimes. O mais grave é perder a liberdade.
As leis que mantém um condenado na cadeia e o outro em liberdade são de 1940. O Código Penal escrito seguindo o modelo do usado na Itália naquela época. E lá o que valia era a vontade de Benito Mussolini, um ditador.
“É um código fascista. Ele é produto de uma cultura dos idos de 40, quando o Brasil vivia uma ditadura e estávamos em guerra. O problema é que os tempos mudaram”, afirmou o advogado Técio Lins e Silva, da comissão da reforma do Código.
Durante as últimas sete décadas, várias tentativas de mudar o Código Penal não deram certo. E ainda por cima, foram criadas novas leis para definir novos crimes. Que estão em outros códigos, como o de Trânsito, o do Consumidor e até no Estatuto da Criança e do Adolescente. São as chamadas leis extravagantes.
“São milhares de artigos, de regras, que estão espalhadas, que nem o juiz sabe exatamente onde está. Então dificulta o funcionamento do sistema e confunde, sobretudo, o cidadão”, destacou Técio Lins e Silva.
No meio de tantas regras, difícil escapar de punições desproporcionais. Explorar o trabalho escravo? Dá 8 anos de cadeia. Já a falsificação de cosméticos, como um batom, pode ser punida com 15 anos de prisão. E as distorções podem ser maiores.
O advogado que defende o rapaz condenado por roubar um celular faz parte do grupo que discute a reforma do Código Penal.
“Roubo tem uma pena de 4 a 10 anos. É quase a pena da lesão corporal seguida de morte, ou seja, se o sujeito é espancado por outro até a morte. O patrimônio vale mais do que a integridade física”, ressaltou o advogado Daniel Nicory do Prado, defensor público.
“Já vi gente que fez muitas coisas pior e já foi embora. E não está passando o tempo que eu estou passando”, disse o presidiário.
Já o condenado que nunca pisou na cadeia, de recurso em recurso, viu sua pena de 18 anos em regime fechado cair pra 6, em regime aberto. O advogado dele conseguiu anular o processo duas vezes.
“Em havendo anulação pela terceira vez essa pretensão do estado de puni-lo ela vai prescrever”, ressaltou Rodrigo Roca, advogado criminalista.
Para trazer o Código Penal de volta a seu tempo, uma comissão de juristas viajou o país. Fez perguntas. Debateu. Ouviu a população. E concluiu: falta castigo pra muita coisa errada que acontece por aí.
A proposta é tornar crime, por exemplo, o bullying, que é a perseguição ou a intimidação a criança ou adolescente. Neste caso, pena de 1 a 4 anos de cadeia. Invasão de computadores ou a divulgação de informações e imagens pessoais: 6 meses a 2 anos. Corrupção dentro de empresas privadas: pena de 1 a 4 anos de prisão. E a definição do crime de milícia: pena de 3 a 10 anos de prisão.
A comissão também sugere que o depoimento de testemunhas seja aceito como prova da embriaguez de um motorista. No caso das drogas, deixa de ser crime plantar ou ter a posse de pequenas quantidades para uso pessoal.
“A prisão vai servir para aqueles crimes graves, aqueles crimes praticados com violência. E nós vamos atenuar as penas em relação a outros tipos de crimes, porque nem sempre a prisão é a única forma de punição”, completou Gilson Dipp, presidente da comissão da reforma do Código.
Investigação deficiente, processos que não terminam. A justiça que não vem. Um novo Código Penal é só o primeiro passo para acabar com a sensação que tanto incomoda a todos nós, a sensação de impunidade.
Essas propostas de mudança no Código Penal vão ser analisadas por uma comissão de 11 senadores. Mas ainda não há uma data pro início do trabalho.
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